quinta-feira, 23 de junho de 2016

De repente 30 e as coisas que esquecemos porque não percebemos o quanto estávamos deixando para trás.


Um dia desses eu estava assistindo pela milésima vez o filme De repente 30, estrelado pela linda Jennifer Garner, no papel de Jenna Rink e Mark Ruffalo, no papel de Matt Flamhaff. Dirigido por Gary Winick, a comédia romântica foi lançada em agosto de 2004 e conta com 1 hora e 48 minutos de pura doçura e delicadeza! 
É impossível não comparar “13 Going on 30” (título original) com “Quero ser Grande” ou “Big”, e sua memorável cena do piano gigante. O filme de 1988 conta a história de Josh, que após encontrar uma máquina dos desejos em um parque de diversões, amanhece com seus 30 anos, papel interpretado por Tom Hanks. 



“Quero ser grande”, sempre esteve na minha lista de filmes favoritos e sempre tive “De repente 30” em um lugar muito especial no coração, por ser aquele filme em que nossos neurônios estão precisando de férias e você precisa de uma ajudinha para deixar a emoção fluir. 
“De repente 30” é uma versão feminina de “Quero ser grande”. O que mais gosto nesses tipos de filme, é a impossibilidade deles acontecerem na vida real. Isso nos deixa com a mente aberta para encarar a proposta e viajar naquela fantasia. Porém, a falta de compromisso com a verossimilhança não impede que as duas obras retratem sentimentos e expectativas reais de uma geração. 
Uma grande diferença divide os dois filmes. Enquanto “Quero ser grande” transporta uma criança para um corpo adulto e o mundo a sua volta continua vivendo na mesma época (Josh amanhece com seus 30 anos, mas nada mudou, criando uma confusão quando sua mãe o encontra no corpo adulto), “De repente 30” vai além, ele transporta a doce Jenna para o universo adulto. Aponta para tudo aquilo que ela deixou para trás e choca a personagem diante do tempo perdido. Seus pais estão envelhecidos, ela se transformou em uma pessoa completamente diferente daquela que ela era e isso ultrapassa as diferenças físicas. Jenna amanhece no mundo que ela mesma construiu. O emprego que ela buscou com as armas que ela quis. E é aí que abandono o “Quero ser grande” e começo a falar sobre “De repente 30”.



Falo com propriedade do assunto! Vai fazer um ano que adentrei nesse mundo supostamente balzaquiano e experimento das loucuras, doçuras e estranhezas de se viver os 30 anos. 
Em 2004, ano de lançamento de “De Repente 30”, ainda era sustentada a ideia de que 30 realmente era a idade do sucesso. Porém, a cada dia, com a briga acirrada do mercado de trabalho e a luta constante e intensa da mulher para conseguir conquistar seu espaço, 30 não é mais a idade do sucesso. Hoje em dia, o sonho de Jenna poderia ser retratado aos 40. Aos 30 eu nem sei o que quero ser ainda e não precisa me chamar de imatura, porque sei que esse é o sentimento compartilhado por muitas mulheres e homens também. 
Se antes nos bastava ter faculdade para a tão sonhada independência financeira, hoje precisamos de mais. Cursos, especializações, mestrados, doutorados... nossa vida escolar e acadêmica está cada dia mais extensa, assim, a realização profissional fica mais distante.
Sem contar que nesse mundo de facebook e whatsapp, vivido por uma juventude dividida entre revolução e conservadorismo, vivemos na era do “nada nos basta” e o sentimento de insatisfação transformou-se quase em uma entidade. 
Como disse James Joyce, “somos uma geração atormentada pelo pensamento” e olha que ele disse isso há 100 anos. Imagina agora onde compartilhamos tanto o que pensamos e temos a oportunidade de dividir em tempo real tudo o que acontece no mundo e no meu condomínio com o vizinho encrenqueiro. 
Viver os 30 anos agora é imprevisível! Não tem como sonhar com ele como Jenna sonhava. Mas é possível entender a sensação descrita pela personagem quando ela diz: “Todos nós queremos sentir alguma coisa que já esquecemos ou rejeitamos, porque não percebemos o quanto estávamos deixando para trás”.
Viver aos 30 anos é ter uma lupa em que conseguimos enxergar os mínimos detalhes do que vivemos. É como subir uma montanha bem alta e se enxergar do alto. Conseguir avistar todos os caminhos que passamos e identificar nossos sentimentos mais escondidos. Nos conhecemos melhor, passamos a reconhecer nossas lágrimas e assim, não as desperdiçamos com tanta imprudência como antes. Temos sentimentos mais honestos, porque reconhecemos de onde eles vêm. Não queremos mais usar roupas que não nos servem, apenas para corresponder às expectativas externas.


Nosso olhar carrega nossa alma, porque não perdemos mais tempo em tentar disfarçar nossos pensamentos e sentimento. Ficamos mais transparentes, o que nos torna mais quebradiças. Mas se aos 20 tentávamos nos defender das quedas, aos 30 só avaliamos se espatifar-se vai valer a pena, porque já nos acostumamos com os ciclos e com finais inevitáveis. Hoje nós só avaliamos pelo o que vale a pena morrer e não nos defendemos disso. Sabemos que nasceremos diversas vezes em uma mesma vida e por isso, selecionamos mais os momentos que dividiremos com os outros. Nos irritamos por perdermos tempo com filmes ruins, livros chatos e relacionamentos rasos. A gente quer tudo aquilo que nos torne melhor do que somos. Queremos viver entre sorrisos irresistíveis e abraços que apertam forte o suficiente para se tornarem inesquecíveis! Não nos importamos em revisitar memórias, não evitamos chorar um pouco quando nos lembramos dos que povoaram nossa vida, mas não nos contentamos apenas com isso.  
Não somos tão fatais como fomos descritas por Balzac. Já não nos basta mais carregar pintas que formam trilhas em nosso corpo, se podemos retirá-las a laser. Não queremos mais dominar nosso parceiro, queremos dividir a fatura do cartão de crédito, queremos poder dormir até mais tarde em um sábado qualquer enquanto ele dá café da manhã para as crianças, queremos poder trabalhar até tarde e comer pizza no jantar. 
Não somos tão sensuais como imaginávamos que seríamos aos 30, nem tão ingênuas quanto pensávamos que continuaríamos. Carregamos linhas na testa e um sorriso meio torto. Não disfarçamos mais nossas dores em poemas inventados e escondidos em diários decorados. 
Completar 30 anos é realmente como a brincadeira fantasiosa do filme. É de repente 30. Parece que antes, tudo nos distraía e não percebíamos toda essa fantástica fábrica de dores e prazeres que é a vida e quando nos demos conta, aterrissamos nessa montanha solitária dos 30. Podemos ver tudo o que vivemos do alto e fazemos questão de prestar bastante atenção na nossa trajetória a partir de agora. Observamos os pequenos sinais do nosso corpo, os saltos e apertos do peito e a paisagem a nossa volta. 
Procuramos resgatar a doçura e a delicadeza que deixamos pelo caminho e aprendemos a rir da vida e do tempo. Queremos nos lembrar de tudo o que era bom, para não nos perdermos em nós mesmas.
Os “All Stars” acabaram com a minha vontade de viver sobre saltos altos, não aprendi a carregar guarda-chuvas nem casaco nos dias cinzentos e vivo pegando sereno e temporais pelo caminho. Não sei qual é meu prato favorito, porque me permito experimentar novos gostos sem medo de surpresas. Não sei de muita coisa como achei que saberia. 
Ter 30 anos é observar a sua vida e perceber tudo aquilo que estamos deixando e decidir entre ousar seguir em frente ou ter coragem de voltar e recolher o que queremos resgatar dos caminhos que deixamos para trás. 



3 comentários:

  1. Querida Pit: também assisti a esse filme e gosto muito. Não me canso de revê-lo. Já passei por essa fase e pela dos quarenta também. Hoje estou na casa dos 50, a meio caminho para os sessenta e não sei se já me encontrei definitivamente. Acredito que cada idade traz um questionamento diferente. Na época de Balzac, 30 era meia-idade, hoje com tanta modernidade, essa "meia-idade" (com se soubéssemos com certeza até quando iremos viver) avançou.De repente 55 (hahahaha), com cabeça de 30. Hoje me considero melhor do que com 20 - minha cabeça era curtinha, cheia de certezas e deixando o que considerava incerto para lá - com isso deixei de viver um amor intenso, o primeiro. Acredito que nem possamos os encontrar, senão pararemos. Imagina se já tivéssemos alcançado tudo que sonhávamos, o que nos restaria a fazer? Nossos sonhos se modificam, a importância das coisas também. Mas, se paramos de desejar, atingiremos outro patamar que não caberá mais nesse plano. Por enquanto, sonhemos e vivamos intensamente nossos desejos, seja quais forem, até ficar na cama até mais tarde. Bjs.

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  2. Que coisa linda! É uma honra ter você por aqui! Obrigada por esse presente! São lindas palavras!

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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